A fim viabilizar o projeto de construção de
fábrica de fertilizantes UFN (Unidade de Fertilizantes Nitrogenados), o
Município de Uberaba (MG) necessita ser suprido por gás natural.
Como solução, os envolvidos conjecturam
construir uma rede de distribuição de 151 km, ligando a rede de Ribeirão Preto
(SP) à futura rede de distribuição da Concessionária Mineira no Triângulo
Mineiro. E a outra, seria a construção de um gasoduto de transporte, de
aproximadamente 240 km, ligando o Gasbol, em São Carlos (SP) ao Triângulo
Mineiro.
Por mais de dois anos, o fornecimento de gás
natural para fábrica de fertilizantes em Uberaba vem se arrastando. Durante
este período, a mídia vem estampando manchetes de reuniões entre representantes
de órgão públicos mineiros e federais, mas sem nenhuma definição.
Verifica-se que os envolvidos estão
negociando em cima de suposições, sem atenção aos preceitos jurídicos que irão
realmente determinar a melhor decisão da pendência.
Para compreender melhor esta questão, há
necessidade entender primeiro a questão da competência constitucional, ou seja,
o que estabelece a Constituição Federal.
Segundo o artigo 25 da Constituição Federal, “os
estados organizam-se e regem-se pelas Constituições e leis que adotarem,
observados os princípios desta Constituição.” E ainda, no parágrafo segundo do
referido artigo que compete “aos Estados explorar diretamente, ou
mediante concessão, os serviços locais de gás canalizado, na forma da lei,
vedada a edição de medida provisória para a sua regulamentação.”.
Por outro lado, no inciso IV do artigo 177 da
Constituição Federal estabelece que “o
transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou de derivados
básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de
conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem”.
Assim, por definição, a distribuição é de
competência dos Estados e o transporte é competência Federal. É evidente a
distinção. Assim, conclui-se que: (a) Rede de distribuição (“serviço local”),
de gás canalizado é de competência exclusiva do estado; e (b) Transporte por
meio de conduto de gás natural (“gasoduto”), é monopólio da União.
A rede de distribuição localizada em Ribeirão
Preto (SP), pertence a uma Concessionária Paulista, portanto, sujeita à legislação
do estado de São Paulo.
De acordo com parágrafo único do artigo 122
da Constituição do Estado de São Paulo, compete “ao estado explorar
diretamente, ou mediante concessão, na forma da lei, os serviços de gás
canalizado em seu território, incluído o fornecimento direto a partir de
gasodutos de transporte, de maneira a atender às necessidades dos setores
industrial, domiciliar, comercial, automotivo e outros.”.
Conforme o Decreto Estadual 43.889, de 1999,
as sociedades titulares das concessões terão como objeto principal a prestação
dos serviços de distribuição de gás canalizado (caput do artigo 15).
E ainda, compete à concessionária fornecer
serviços de gás canalizado a usuários localizados em sua área de concessão, nos
pontos de entrega definidos nas normas dos serviços, pelas tarifas homologadas
pela Agência Reguladora de Saneamento e Energia do Estado de São Paulo
(Arsesp), nas condições estabelecidas nos respectivos contratos de fornecimento
e nos níveis de qualidade, segurança e continuidade estipulados na legislação e
nas normas específicas (inciso I do artigo 19).
Todavia, poderão exercer, desde que
respeitadas as normas legais pertinentes e mediante prévia autorização da
Arsesp, a atividade de transporte de gás canalizado, desde que não interfiram
na atividade principal da concessionária e que as receitas auferidas, que
deverão ser contabilizadas em separado, contribuam para o favorecimento da
modicidade das tarifas do serviço de gás canalizado (parágrafos 1º e 2º do
artigo 15).
Por outro lado, no caso do estado de São
Paulo, a regulamentação tarifária emanada pela Comissão de Serviços Públicos de
Energia (CSPE, atual Arsesp), determinar na Nota Técnica 1 – Metodologia para
Revisão Tarifária das Concessionárias de Gás Canalizado (outubro/2003) –, a
forma apropriada de apurar o valor da margem máxima da tarifa. Segundo a
referida metodologia é necessário levar em consideração que a receita da
Concessionária tem dois componentes fundamentais: (a) Custos operacionais
(Opex) – vinculados à operação e manutenção dos ativos necessários para a
prestação do serviço, gestão comercial dos usuários, direção e administração da
empresa; e (b) Remuneração sobre o capital – é remuneração do capital investido
(Capex) nos ativos efetivamente necessários para a prestação do serviço, com os
níveis de qualidade exigidos no Contrato de Concessão, de modo a assegurar a
viabilidade econômica do negócio.
Deste modo, simples utilização de rede de
distribuição gás canalizado da Concessionária, como gasoduto de transporte, lesará
os consumidores da região do Estado, onde a rede estiver instalada, visto que,
estes consumidores vêm pagando a tarifa, com o percentual sobre a remuneração
do capital invertido pela Concessionária na implantação da rede de distribuição
de gás canalizado. Salvo se contribuir em favor da modicidade das tarifas do
serviço de gás canalizado no estado.
Caso análogo no estado, a Arsesp estabeleceu
condições e critérios para a prestação dos serviços de distribuição de gás
canalizado entre as Concessionárias do Estado de São Paulo, através da Portaria
CSPE 382, de 2005:
(a) “considerando a necessidade de
expansões de redes de distribuição de gás canalizado, em especial em áreas
fronteiriças das áreas de concessão, nas quais se configuram precárias as
expansões a partir de "city gate" no âmbito da área de uma
distribuidora, comprometendo o desenvolvimento regional da indústria do gás”;
(b) “considerando o interesse do Estado de
São Paulo na eficiente integração das redes das distribuidoras, proporcionando
a universalização da prestação dos serviços de distribuição de gás canalizado”;
(c)“considerando
o estabelecimento de melhor traçado de redes de distribuição, a viabilidade
técnica e econômica da expansão de redes de distribuição, projeto que atende o
interesse público na prestação dos serviços de distribuição de gás canalizado”.
Assim, não existe lacuna regulatória sobre a
questão da conexão interestadual de redes de distribuição de gás canalizado,
unicamente, porque não existia um evento concreto. A solução deste caso compete
somente aos estados interessados na conexão de suas respectivas redes
distribuição. Às agências reguladoras dos estados envolvidos compete
disciplinar os padrões da conexão, como ocorreu, por exemplo, em 2005, no
estado São Paulo, que culminou na portaria acima. Assim, qualquer interferência
Federal nestes casos, será danosa ao ordenamento constitucional e ao consumidor.
Pelo exposto, num país carente de gasoduto,
ao invés de construir uma rede de distribuição dedicada, poder-se-ia construir
um novo gasoduto de transporte, o qual irá beneficiar diversos municípios
brasileiros, inclusive Estados. Como é o caso do gasoduto da empresa
Transportadora de Gás do Brasil Central (TGBC). Este gasoduto terá 817 km de
extensão, ligando os Municípios de São Carlos (SP) à Brasília (DF), passando
pelo Triângulo Mineiro. E quiçá, no futuro, poderia este ramificar para outros
estados.
Está na hora do Brasil planejar as questões
de infraestrutura de forma global.
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