O reassentamento conduzido pela
mineradora Vale Tinto em Moçambique tem se mostrado ineficaz, trazendo
transtornos a boa parte das 1.365 famílias envolvidas no processo ao dificultar
o acesso a alimentos, água e trabalho, diz um relatório de 122 páginas do Human
Rights Watch (HRW) intitulado "O que é uma casa sem comida? - O boom de
mineração de carvão e os reassentamentos em Moçambique", divulgado nesta
quinta-feira, 23. A denúncia envolve também reassentamentos feitos pela Rio
Tinto, com os quais o número total sobe para 1.429 famílias.
Segundo o relatório, a implementação
das mineradoras na Província de Tete fez com que as famílias, a maior parte de
comunidades agrícolas, fossem transferidas para áreas de solo árido, longe de
rios e dos mercados. A Província de Tete, segundo o levantamento, tem 23
bilhões de toneladas de reservas de carvão, a maior parte inexplorada e as
concessões de mineração aprovadas e licenças de exploração cobrem
aproximadamente 3,4 milhões de hectares, ou 34% da área da província.
O documento afirma que a Human Rights
Watch teve pelo menos 35 reuniões com executivos da Vale, Rio Tinto e também
com uma terceira mineradora, a indiana Jindal Steel and Power, para tratar a
questão. Segundo a organização, as empresas reconheceram que os reassentamentos
foram feitos em locais áridos e que necessitam de irrigação para que sejam
férteis. "Mas até abril de 2013 não existiam sistemas de irrigação
amplamente acessíveis no local", relata o documento. "Os locais de
realojamento, com opções de transporte limitadas, também reduziram a capacidade
das comunidades para ganhar a renda não-agrícola", acrescenta o documento.
Protestos
Por causa da demora em resolver a
situação, moradores dos dois reassentamentos da Vale - Cateme e 25 de setembro
- têm feitos vários protestos e, em janeiro, chegaram a bloquear a ferrovia que
liga a mina de carvão da Vale ao porto da Beira.
"A velocidade do governo
moçambicano em aprovar licenças de mineração, com a intenção de atrair bilhões
de dólares em investimentos, negligenciou a criação de medidas para proteger as
populações diretamente afetadas", diz o texto.
O pesquisador do HRW, Nisha Varia,
diz que o governo moçambicano e as empresas devem assegurar aos agricultores
terras produtivas até a próxima safra e compensação pelas deficiências
decorrentes do processo de reassentamento.
Segundo o relatório, os reassentos da
Vale foram feitos em 2009 e 2010. A Rio Tinto comprou em 2011 a australiana
Riversdale, sendo ambas responsáveis pelo reassentamento de 71 e 13 famílias, respectivamente.
A Rio Tinto pretende reassentar mais 388 famílias este ano.
O outro lado
Nesta quinta-feira, 23, a Vale
divulgou uma nota se defendendo das acusações feitas no relatório da HRW.
"Como explicado à Human Rights Watch, ainda há melhorias a serem feitas
nas infraestruturas dos reassentamentos e a Vale está empenhada no
desenvolvimento de ações de apoio a essas famílias, em conjunto com as esferas
governamentais, para atender às necessidades das comunidades
reassentadas", diz a empresa.
A Vale abordou vários itens do
documento, referentes à assistência alimentar e consertos de residência. Sobre
o problema de abastecimento de água e irrigação dos assentamentos, a Vale
informou que concluiu a reabilitação do sistema de abastecimento existente em Cateme,
revendo os equipamentos e condicionando-os para um pleno funcionamento.
A Vale informou ainda que está em
processo de formação de 17 agentes comunitários, moradores de Cateme e 25 de
setembro, com o objetivo de fortalecer os canais de comunicação com a
comunidade. "Estes agentes serão capazes de mapear as principais questões
da comunidade, permitindo uma melhor capacidade de escuta e gestão das
demandas."
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