A
política de metas de produtividade para os funcionários não é recente e
espalha-se para um número cada vez maior de estabelecimentos, estando presente
em diversas empresas, entidades financeiras e até órgãos públicos. As metas
seguem a lógica pós-fordista de produção e têm como finalidade garantir o maior
rendimento possível dos funcionários, cortando os tempos mortos.
Entende-se
que existe um limite mínimo de produtividade que todo empregado tem que
alcançar, caso contrário seu rendimento é considerado insatisfatório e seu
emprego fica ameaçado. O que se tem visto, no entanto, é uma constante elevação
desse patamar mínimo. As metas tornam-se mais altas e exigentes e a pressão
exercida sobre os empregados para que eles alcancem esses níveis é cada dia
maior.
Chegou-se
ao ponto em que as metas e a exigência para que sejam alcançadas representam um
distúrbio no ambiente de trabalho, elevando a tensão e o estresse a que são
submetidos os trabalhadores. Realidade ainda mais evidente no ambiente
bancário.
Não se
trata de um simples pedido do empregador para que o empregado trabalhe mais,
mas de uma cobrança desmedida para que se cumpra uma meta praticamente
inatingível, gerando no empregado uma insegurança constante com relação à
continuidade da relação de emprego.
Diante
desse quadro, o Poder Judiciário reconhece que a política abusiva de metas
causa danos aos empregados e gera direito à reparação por assédio moral. O
Tribunal Superior do Trabalho apresenta vasta jurisprudência em que afirma o
direito à indenização aos empregados submetidos a metas exageradas.
O assédio
moral é caracterizado pelo constrangimento psicológico constante e prolongado
causado a uma pessoa, capaz de gerar ofensa à sua personalidade, dignidade ou
integridade psíquica.
O que se
vê nos Tribunais é que as demandas indenizatórias são, majoritariamente,
individuais. Sabe-se que, em alguns casos, a pressão exercida sobre determinado
funcionário é maior do que a dos demais. Situação especialmente comum quando se
pretende que o empregado desista de seu posto, evitando para o empregador o
pagamento dos direitos trabalhistas advindos de uma demissão sem justa causa.
Apesar
dessa tão conhecida realidade, a forma de gestão que impõe metas exageradas
atinge a todos os empregados, gerando desequilíbrio para o meio ambiente de
trabalho de forma geral. Desta forma, o combate a essa política deve adotar
diretrizes também coletivas.
A
política exagerada de metas não se configura apenas como assédio moral
praticado contra um empregado específico, mas como assédio moral
organizacional. Não se trata de pressionar, exigir demasiadamente, gerar o
sentimento de menosprezo, incapacidade ou inferioridade em um único empregado,
mas de fazê-lo como forma de gestão de pessoal do banco ou empresa. Ou seja, o
assédio torna-se uma política institucional.
Quando o
assédio moral ganha essa dimensão, deve ser encarado como um problema coletivo,
não apenas em demandas individuais. Diversas são as possibilidades dessa
abordagem, passando pela configuração do assédio moral coletivo e pela poluição
do meio ambiente de trabalho.
Como
aponta Guilherme Feliciano, a preocupação com o meio ambiente do trabalho surge
nas últimas décadas, quando se percebe que um importante fator ambiental é o
fator humano e que os desequilíbrios sociais afetam o equilíbrio ambiental.[1]
O meio
ambiente, com a Constituição Federal de 1988 e o desenvolvimento da
hermenêutica da centralidade da dignidade humana, deixa, então, de ser compreendido
apenas em seu elemento físico ou natural[2],
para ser integrado também pelos aspectos cultural (art. 215, §1º e 2º, da
Constituição), artificial (arts. 182, 21, XX e 5º, XXIII, da Constituição) e do
trabalho (arts. 7º, XXXIII e 200, VIII da CF).[3]
Para José
Afonso da Silva, a importância do meio ambiente do trabalho parte da
compreensão de que se trata do “local em que se desenrola boa parte da vida do
trabalhador, cuja qualidade de vida esta, por isso, em íntima dependência da
qualidade daquele ambiente”[4]
De início,
os estudos sobre os desequilíbrios do meio ambiente do trabalho se concentravam
na saúde física do trabalhador, em especial, com a configuração de situação
perigosas ou insalubres. Apesar da extrema importância dessas questões,
percebeu-se que as relações de trabalho estão permeadas por diversos distúrbios
ao meio ambiente de trabalho que não afetam, de imediato, à saúde física do
trabalhador. Com isso, surge a preocupação com a sua higidez mental.
Ganham
maior destaque as pesquisas que apontam a relação direta entre a fadiga mental
e o desenvolvimento de doenças psíquicas e psicossomáticas, o aumento de
acidentes no trabalho e a queda de produtividade.
Diante
disso, reconheceu-se que as situações provocadas no ambiente laboral que afetem
a higidez física ou psicológica dos trabalhadores podem ser consideradas uma
forma de poluição. Segundo a redação do art. 3º, III, a e b, da Lei 6.931/81,
poluição é a “degradação da qualidade ambiental resultante de atividade que
direta ou indiretamente (…) prejudiquem a saúde, a segurança e o bem-estar da
população (...)” e/ou “criem condições adversas às atividades socais e
econômicas”.
Desta
forma, toda e qualquer atividade que deteriore o meio ambiente laboral é uma
poluição, portanto, nociva ao trabalhador. Essas teorias têm ganhado mais
espaço e respeito entre doutrinadores e juristas do trabalho, reconhecendo o
direito ao meio ambiente do trabalho equilibrado.
Desdobramento
importante dessa teoria é a possibilidade de introduzir no Direito do Trabalho
princípios e normas oriundos do Direito Ambiental. Dentre eles, o Princípio do
Poluidor Pagador, segundo o qual poluidor é a “pessoa física ou jurídica, de
direito público ou privado, responsável, direta ou indiretamente por atividade
causadora de degradação ambiental”, e, em decorrência dessa degradação, tem o
dever de reparar o dano causado.
O
Princípio do Poluidor Pagador está presente em diversos textos normativos
ambientais, dentre eles o artigo 14, parágrafo 1º, da Lei 6.938/1981, que
afirma:
Art 14 —
Sem prejuízo das penalidades definidas pela legislação federal, estadual e
municipal, o não cumprimento das medidas necessárias à preservação ou correção
dos inconvenientes e danos causados pela degradação da qualidade ambiental
sujeitará os transgressores:
§ 1º — Sem obstar a aplicação das penalidades
previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência
de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a
terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos
Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e
criminal, por danos causados ao meio ambiente.
Desta
forma, o empregador que seja considerado poluidor é obrigado a indenizar suas
vítimas independente de culpa, ou seja, não será necessário que sem comprove
que o empregador agiu de forma intencional, querendo causar dano ao meio
ambiente do trabalho, bastando que esteja configurado o assédio moral
organizacional como forma de poluição.
Conclui-se,
assim, que o empregador que submeta os empregados a metas exageradas é obrigado
a ressarci-los de forma geral pelo assédio moral organizacional, causador de
poluição ao meio ambiente do trabalho.
Além
disso, a possibilidade de vedar as metas excessivas tanto pela configuração do
assédio moral, quando pela poluição ao meio ambiente de trabalho, demonstra o
quanto são nocivas aos empregados, tornado o ambiente em que estão extremamente
penoso.
É preciso
que se afirme que a Constituição Federal elege dentre os elementos de
desequilíbrio labor ambiental a penosidade, definida como “condição de especial
desgaste que exige do trabalhador um empenho físico ou psicológico que crie
desgaste acima do normal”. Apesar da penosidade ainda aguardar regulamentação
legal, há sindicatos que conseguiram receber um adicional a ela referente,
conquistado por meio de negociação coletiva.
Percebe-se,
portanto, que as possibilidades de enfrentamento às políticas de metas são
variadas e bem fundamentadas, extrapolando o caráter individual e judicial que
atualmente recebem.
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