Governo quer fazer uma minirreforma trabalhista para tirar mais direitos


O Jornal Folha de São Paulo, noticiou em sua edição desta última sexta-feira (12) que a comissão mista da MP (Medida Provisória) da Liberdade Econômica aprovou o parecer do deputado federal Jerônimo Goergen (PP-RS) com mudanças em 36 artigos da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho).

De acordo com a apuração do Jornal, ao todo, foram alterados, reescritos ou inseridos cerca de 90 pontos, entre artigos, incisos e parágrafos. O novo texto recebeu o aval de deputados e senadores da comissão nesta quinta-feira (11) e continua sendo analisado para ter condições de ser colocado em discussão no plenário da Casa.

A MP editada pelo presidente Jair Bolsonaro, em 30 de abril, institui a Declaração de Direitos de Liberdade Econômica. A intenção, segundo o governo, é desburocratizar processos para empresas. Não havia citação à CLT. Agora, o texto libera o trabalho aos domingos para todas as categorias, afrouxa regras para composição de Cipa (Comissão Interna de Prevenção de Acidentes) e aplica regras do direito civil a trabalhadores com altos salários.,



Minirreforma em andamento

Para especialistas em direito do trabalho, está em curso uma minirreforma da CLT. A tramitação da MP, segundo Noemia Porto, presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), repete os procedimentos da reforma trabalhista do governo Michel Temer (MDB), de 2017.“Foi o mesmo modus operandi: eram poucos dispositivos, e o número [de mudanças] cresceu”, afirma Porto. Segundo ela, a medida deveria abordar apenas matéria urgente e relevante.

O texto enviado por Bolsonaro tinha 19 artigos. Ao todo, foram apresentadas 301 emendas. Goergen acatou 81 sugestões dos colegas. O texto final ficou com 53 artigos.As alterações remetem a diversas leis, como a CLT e o Código Civil. Houve acordo para a aprovação do parecer, e apenas três congressistas rejeitaram a matéria.

Otavio Pinto e Silva, professor de direito do trabalho da USP (Universidade de São Paulo) e sócio do escritório Siqueira Castro, destaca o volume de novas regras na CLT.“É uma minirreforma pela quantidade de dispositivos legais alterados e revogados, até mesmo mexendo em normas que tinham sido alteradas em 2017”, afirma Silva.


O professor de direito do trabalho da FMU Ricardo Calcini aponta para a relevância dos assuntos alterados.“É praticamente outra reforma trabalhista, claro que não na magnitude da lei 13.467 [reforma trabalhista de Temer]. Mas acaba tratando de pontos muito importantes”, afirma.


Relator desconversa
À Folha o relator da matéria diz rejeitar as críticas e comemora o resultado dos debates.“Não concordo que seja uma minirreforma trabalhista. Não mexemos nos direitos trabalhistas. O que estamos tirando é aquilo que ficou faltando na reforma trabalhista [de 2017] e tem de melhorar”, diz.

“Se a Justiça acha que é minirreforma, que bom. Estamos avançando. Estamos dando mais segurança jurídica, e isso tira poder. Gostaria de ter avançado em mais pontos”, afirma o relator.

Entre as mudanças está a que diz que “fica autorizado o trabalho aos domingos e feriados”. Ao menos, um domingo de descanso é assegurado ao trabalhador.A CLT já prevê exceções para o trabalho aos domingos. Há a possibilidade de autorização em negociação coletiva.


Mais desculpas esfarrapadas
O governo pretendia ampliar essa liberação para 78 setores. “[Agora] Vai valer para todo mundo. Não tem mais essa frescura, como diz o gaúcho”, afirma Goergen. Sem contar que o referido deputado participou de uma live de Bolsonaro no facebook, ao vivo, para destacar que essa medida irá potenciar a geração de emprego. Mesmo argumento utilizado no governo anterior para aprovar a Reforma Trabalhista, que dados comprovam que não surtiu o efeito esperado.4



Acidentes de trabalho vão aumentar
Em relação à comissão de prevenção de acidentes, o texto mantém a regra atual, que exige a formação do grupo onde há mais de 20 trabalhadores. Porém, micro e pequenas empresas ficam dispensadas de organizar uma Cipa.

“Há abrandamento das regras com a exclusão de micro e pequenas empresas”, diz Calcini, professor da FMU.Segundo Silva, da USP, empresas com poucos funcionários também podem ser obrigadas hoje a instituir uma comissão em razão do grau de risco da atividade econômica.

À Folha Goergen diz que atende a uma demanda: “Os setores se queixavam muito porque tinha a estabilidade [de um ano para quem integra Cipa], isso é um absurdo”.


O relator afirma que o texto resulta de negociação com congressistas, setores produtivos, oposição e governo. “Foi uma construção feita a várias mãos”, diz.

Entre as mudanças feitas a pedido da equipe econômica, segundo Goergen, está a criação da carteira de trabalho digital.



Carteira "Verde Amarela"
O parecer do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) para a MP (Medida Provisória) da Liberdade Econômica diz que trabalhadores que ganham mais de 30 salários mínimos (R$ 29.940) terão o contrato regido pelo direito civil.

São assegurados direitos previstos na Constituição, como férias e 13º salário.“Me parece a carteira verde e amarela [proposta de campanha de Jair Bolsonaro]. O legislador dá a possibilidade de se negociar diretamente com o empregador cláusulas que vão reger o contrato de trabalho”, diz Ricardo Calcini, professor da FMU.

Otavio Pinto e Silva, professor da USP e sócio do escritório Siqueira Castro, concorda.“É uma maneira de criar a ideia da verde e amarela, para a qual não há direito do trabalho. As pessoas combinam o que bem entender porque o salario é mais elevado.”

Goergen vê avanço. “Vai valer a regra do contrato.”Para virar lei, o texto precisa ser aprovado no plenário da Câmara e do Senado até o dia 10 de setembro. Uma MP vale por até 120 dias. 

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