Vale deixou de relatar para agência de mineração problemas e riscos em barragem de Brumadinho



Um relatório apresentado pela ANM (Agência Nacional de Mineração), na última terça-feira (5), em Brasília (DF), aponta que a Vale não registrou no Sigbm (Sistema Integrado de Gestão de Segurança de Barragens e Mineração) problemas e risco à segurança que vinham sendo identificados na barragem B1, na mina Córrego de Feijão, em Brumadinho (MG).

O rompimento da estrutura, ocorrido em 25 de janeiro deste ano, deixou 252 mortos e ainda tem 18 desaparecidos, segundo órgãos estaduais. O gatilho que levou o rompimento ainda é investigado.
De acordo com a AMN, as informações registradas pela Vale no sistema não condiz com os dados de documentos internos da mineradora sobre problemas da estrutura. Informações de risco de rompimento também deixaram de ser reportadas, o que impediu que a agência tomasse medidas cautelares e pedisse ações emergenciais que poderiam ter evitado a tragédia.

A diferença entre os registros, segundo a agência, foram percebidas somente após o rompimento, quando técnicos chegaram ao local para avaliar a situação. O relatório de 194 páginas foi analisado por especialistas e aprovado por um colégio no dia 31 de outubro.

ANÁLISES
O relatório aponta que, 15 dias antes da tragédia, os níveis de dois piezômetros – instrumento utilizado para medir a pressão da água, que ajudam no cálculo de estabilidade – estavam em nível de emergência. Em dezembro, leituras de radar também indicaram anomalias. A AMN não foi informada de nenhuma questão.

Um dos principais problemas apontados ocorreu na instalação do DHPS (drenos horizontais profundos, que controlam o nível de água dentro da estrutura). Um relatório interno da Vale reconhece que detectaram a presença de material sólido no maciço – interior da barragem – o que é considerado anormal. Outra vez, a ANM não foi comunicada.

Na instalação de outro DHP, foi identificado um problema de percolação de nível 6 por um técnico da própria Vale – o que significa umidade ou surgência, que demandaria medidas corretivas. No sistema da AMN, a questão foi registrada como nivelo 0 – o que significa que estava controlada – e depois alterada para nível 3 – monitorada e controlada.

PROVAS
Acessando fotos de documentos internos da mineradora, depois do rompimento, técnicos da ANM avaliaram que a situação deveria ter sido identificada como nível 10 – anomalia com potencial de comprometimento da segurança da estrutura – o que poderia ter colocado a barragem como prioridade para inspeção.

No relatório, a ANM cita a constatação de informações que foram “suprimidas” da inspeção do órgão fiscalizador. O sistema Geotec tinha cinco fotografias feitas em uma inspeção do dia 6 de junho de 2018, indicando anomalias, como presença de sedimentos na saída de um dos drenos.

Nas informações enviadas à AMN, porém, foi anexada apenas uma foto, “reportando apenas danos em uma canaleta de drenagem superficial do talude de jusante, desconsiderando as informações mais relevantes registradas na quinzena”.

A situação mais severa, segue a AMN, ocorreu no dia 11 de junho de 2018, quando houve uma falha de perfuração. “Somente após a notificação da AMN, efetuada nos levantamentos documentais da vistoria realizada após o rompimento da Barragem 1, a Vale S.A encaminhou reporte citando o carreamento de sólidos relacionados à perduração do DHP-15”, diz o documento.

A AMN aponta ainda que o penúltimo reporte da Vale sobre o B1 foi feito no dia 8 de janeiro enviado a cinco dias após o rompimento. Nele, constava que a barragem não tinha nenhuma anomalia. A agencia chama atenção, porém, ao fato de que o último reporte, realizado três dias antes da tragédia, e entregue na metade de fevereiro, tinha todas as irregularidades listadas.

RESPOSTA
Em resposta à Folha, a Vale informou que vai analisar o relatório na integra e não pode comentar decisões técnicas tomadas por geotécnicas na época, “profissionais altamente experientes e de reconhecida capacitação para tratar de questões referentes à manutenção´ da barragem B1”.

“Todas as informações disponíveis sobre o histórico do estado de conservação da barragem foram fornecidas às autoridades que apuram o caso. A Vale reforça que aguardará a conclusão pericial, técnica e científica sobre as causas da ruptura da barragem”, segue a nota.
Fonte: Folha de SP

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