Venda de produtos de alto valor em emergentes no foco da ADM



Fonte: Valor

Diante de um cenário marcado por pequenos crescimentos, estagnação ou mesmo queda na demanda por produtos do agronegócio nos Estados Unidos e na Europa, não há outro caminho para os grandes grupos globais do setor a não ser voltar suas atenções para os países emergentes, estejam eles onde estiverem. Chavão nesse e em diversos outros setores da economia, tal ajuste de foco tem promovido mudanças estratégicas importantes em empresas multinacionais - e, particularmente no agronegócio, algumas dessas mudanças têm conferido um novo status ao Brasil no tabuleiro global. Tradicional exportador de matérias-primas, o país, também um grande consumidor, passou a atrair, com o recente aumento da renda da população, mais investimentos em produtos de maior valor agregado.

A americana Archer Daniels Midland (ADM), uma das maiores empresas do setor, escreveu nesta semana mais um capítulo dessa história. E, no que tange à soja, carro-chefe do agronegócio brasileiro, um dos mais representativos dos últimos anos. Como informou o Valor, a companhia lançou na segunda-feira a pedra fundamental da nova fábrica de proteínas que terá em Campo Grande, o maior aporte individual da múlti no Brasil desde que iniciou operações diretas no país, em 1997. Os US$ 250 milhões que serão investidos na planta, que deverá começar a operar no fim de 2015, representam também o maior investimento a ser anunciado pela empresa no mundo neste ano. E, não por coincidência, foi o próprio presidente global da ADM, o argentino Juan Ricardo Luciano, que apresentou o projeto às dezenas de autoridades e empresários que participaram do evento na capital de Mato Grosso do Sul.

"Há grandes oportunidades no Brasil e em outros emergentes. Cerca de 60% do nosso capital de crescimento tem sido aplicado fora dos Estados Unidos, com grande destaque para esses mercados. E o Brasil é um dos poucos países do mundo onde há grande oferta para originação [de produtos agrícolas] e um mercado consumidor expressivo, não só de commodities", afirmou Luciano ao Valor logo após a cerimônia de segunda-feira. De acordo com ele, a multinacional, que atua em mais de 140 países, tem investido globalmente entre US$ 1 bilhão e US$ 1,2 bilhão por ano, e os emergentes continuarão na mira desses recursos nos próximos anos. No trimestre encerrado em março, as vendas globais da companhia somaram US$ 20,7 bilhões e seu lucro líquido alcançou US$ 267 milhões.

A ADM não detalha geograficamente seus resultados, mas sabe-se que a América do Sul, com destaque para o Brasil, já representa quase 10% de suas vendas mundiais. E, nessas vendas, a tendência é que os produtos de maior valor agregado ganhem peso. "É difícil saber se a participação desses produtos nas vendas vai aumentar por causa da importância das exportações de commodities nos negócios na região, que também serão crescentes. Mas o potencial é muito grande. E há um detalhe importante: nossas operações são integradas. Não fazemos trading de nada que não processamos", pontuou Luciano. "É preciso observar que fatores como a obesidade, entre outros, não estão só em países ricos. Na Índia, o risco cardíaco é um dos maiores do mundo. Daí o potencial de vendas de proteínas de soja, por exemplo, em emergentes", disse.


No primeiro quadrimestre, as exportações da companhia a partir do Brasil alcançaram US$ 1,275 bilhão, conforme a Secretaria de Comércio Exterior (Secex). Com isso, a ADM ficou na sétima posição entre as maiores exportadores do país no período, atrás das concorrentes Cargill (US$ 1,705 bilhão, a terceira da lista) e Bunge (US$ 1,580 bilhão, a quarta) e à frente de Louis Dreyfus Commodities (US$ 1,258 bilhão, a oitava). ADM, Bunge, Cargill e Dreyfus, que lideram a comercialização de commodities agrícolas no mercado internacional, formam o grupo conhecido como "ABCD". Como a ADM, Bunge e Cargill têm suas sedes nos Estados Unidos, enquanto a Dreyfus é francesa de origem. "Não somos uma companhia dos Estados Unidos, somos uma empresa global", retruca Luciano. A seu favor, o executivo poderia ter citado o fato de ser argentino e ocupar, como presidente e COO, a segunda posição mais importante na estrutura ADM, abaixo da CEO Patricia Woertz.


Mas não o fez. Em linha com o discurso padrão de Decatur, onde está a sede da múlti, preferiu, em diversos momentos, destacar o "forte time" empregado na empresa, que tem 31 mil funcionários - 4,7 mil no Brasil. Atencioso, Luciano, 52 anos, começou a trabalhar na ADM em abril de 2011, após 25 anos na também americana Dow Chemical, boa parte deles na subsidiária brasileira da companhia. Na entrevista que concedeu ao Valor pela Dow, em julho de 2007, era o responsável pela área de hidrocarbonetos e energia. Quando deixou a Dow, era vice-presidente executivo global e presidente da divisão de "performance". Foi anunciado como presidente e "chief operating officer" da ADM em fevereiro deste ano. É o 12º presidente da história de 112 anos da empresa.


O investimento da companhia na fábrica de proteínas de soja em Campo Grande - a primeira da empresa fora dos EUA, onde conta com uma unidade -, também exigirá da ADM uma relação mais próxima com seus clientes dos setores de alimentos e bebidas instalados na América do Sul, uma vez que é possível desenvolver proteínas "sob medida" para cada um deles e esse trabalho tem que ser feito em parceria. E a múlti aposta no sucesso dessa aproximação para ampliar as vendas em relação ao volume atualmente importado desde a planta americana. A fábrica brasileira, que deverá ficar totalmente pronta no primeiro semestre de 2016, terá capacidade para produzir 50 mil toneladas por ano em três unidades. Se fosse começar a operar hoje, usaria cerca de 70% de sua capacidade.


Conforme Luciano, esse fortalecimento dos emergentes em geral - é evidente que o executivo destacou o mercado de consumo da China, "onde a ADM tem investido muito em qualidade e segurança" - e do Brasil em particular nos negócios do grupo também pode ser conferido nas trocas de experiências e estratégias entre suas subsidiárias. "Na Índia, estamos aplicando um projeto na área de embalagens desenvolvido no Brasil". É apenas um exemplo entre outros que, no futuro, poderão se multiplicar inclusive nos EUA.

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