Programa Verde Amarelo tem viés arrecadatório e pode reduzir produtividade do trabalhador


O programa Verde Amarelo, criado pelo governo Jair Bolsonaro (sem partido) para impulsionar a contratação de jovens, pode ter efeito negativo no mercado de trabalho, revelam estudos feitos pelo Senado Federal e pelo próprio Ministério da Economia. Se aprovado, o governo pode gastar mais em desoneração que no próprio salário dos jovens, além de reduzir a produtividade. Por outro lado, caso aconteça contratação em massa, poderá mais reforçar o caixa do governo do que de incentivo ao emprego. Projeto semelhante feito no governo Dilma não deu certo.

Pelo programa, as empresas que contratarem jovens de 18 a 29 anos, que nunca tiveram vínculo formal de trabalho, com salário mensal de até 1,5 salário mínimo (hoje, R$ 1.497), ficam isentas de pagar contribuição previdenciária, salário-educação e contribuições ao Sistema S. Além disso, a contribuição mensal ao FGTS cairá de 8% para 2% e o valor da multa em caso de demissão sem justa causa poderá ser reduzido de 40% para 20%. Ao todo, as empresas têm uma redução de até 34% nos impostos que pagam hoje.

Segundo estudo interno feito pela Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia, em pela Reuters, o custo mensal do programa Verde Amarelo é mais alto que o próprio salário médio a ser recebido pelos trabalhadores participantes. 

Nos cálculos da SPE, o custo fiscal do programa é de R$ 5,9 bilhões de 2020 a 2024, ou R$ 1.929,37 reais ao mês por trabalhador, considerando um salário médio de contratação de R$ 1,2 mil.

"Cabe destacar o elevado custo estimado do programa para cada novo emprego gerado, bem como a possibilidade de impactos adversos na empregabilidade da população não elegível", trouxe o estudo de 11 de novembro, mesma data de divulgação do programa Verde Amarelo.

A SPE destacou que a desoneração promovida potencialmente geraria empregos para a faixa etária almejada, mas criaria margem para substituição de trabalhadores não elegíveis no mercado de trabalho."O impacto do programa sobre a geração líquida de empregos é, assim, incerto", pontuou.

"A avaliação final sobre a conveniência do programa depende, assim, de uma ponderação entre seus prós e contras, que não cabe a esta subsecretaria realizar", acrescentou o documento.

Baixa produtividade 
Além de ser caro, o programa pode acabar reduzindo a produtividade na economia ao abrir espaço para que trabalhadores qualificados sejam trocados por jovens ainda não qualificados, na busca das empresas por diminuição dos custos trabalhistas, afirmou a SPE no documento. 

Essa substituição de empregados também põe em dúvida o potencial do programa em contribuir efetivamente para a criação líquida de vagas de trabalho, argumenta a secretaria.

O estudo, assinado pelo subsecretário de Política Fiscal, Marco Antônio Cavalcanti, e pelo coordenador-geral de Política Fiscal, Bernardo Schettini, ressalvou que os cálculos eram preliminares e enfatizou que caberia à Receita Federal fazer as estimativas oficiais.

Atualmente no comando da SPE, o secretário Adolfo Sachsida foi um dos autores de estudo do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) de 2018 que concluiu que a desoneração da folha promovida pelo governo da ex-presidente Dilma Rousseff (PT) não teve impacto na geração de empregos.

Diferentemente da desoneração de Bolsonaro, que estabeleceu o recorte etário, a da ex-presidente privilegiava setores específicos, que passaram a contribuir com um valor sobre o faturamento em troca da alíquota de 20% sobre a folha de pagamento.

Viés arrecadatório 
Outro estudo, dessa fez feito pela Instituição Fiscal Independente (IFI) do Senado, calcula que o programa Verde Amarelo tem um viés mais arrecadatório - ou seja, reforçar o caixa do governo - do que de incentivo ao emprego. O documento, obtido pelo jornal O Estado de S. Paulo, prevê que a taxação do seguro-desemprego, prevista no programa, pode render R$ 12,7 bilhões até 2024, acima do custo potencial de R$ 11,3 bilhões caso 100% da meta de 1,8 milhão de vagas seja atingida, possibilidade considerada de difícil execução pelo órgão. Mesmo assim, o ganho de receita, nesses cinco anos, seria de R$ 1,4 bilhão. 

Num cenário de cumprimento de metade da meta de empregos (900 mil vagas), o custo do programa entre 2020- 2024 cairia para R$ 5,7 bilhões. Isso garantiria um ganho extra de R$ 7 bilhões na arrecadação com nova taxação do seguro-desemprego. Já num quadro de cumprimento de um quarto da meta (450 mil vagas), o custo do programa em cinco anos seria de R$ 2,8 bilhões, rendendo um adicional de R$ 9,9 bilhões para o caixa do governo. 

O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), já afirmou que estuda devolver parte do programa ao governo sem votar. Parecer da consultoria legislativa do Senado já tinha avaliado como inconstitucional a isenção das contribuições de empresas que incidem na folha de pagamento, o cerne da proposta. 

Segundo o autor do estudo, Rafael Baccioti, programas parecidos com o Verde Amarelo adotados pelos governos no passado, como o Primeiro Emprego, de Lula, e a desoneração da folha, de Dilma Rousseff, não foram capazes de gerar tantas vagas como o previsto inicialmente. "Queremos mostrar que, se a meta de geração de vagas não for atingida, a renúncia será menor e a arrecadação com a taxação continuará lá", diz ele. 

A IFI diz que seria melhor buscar outras fontes para bancar o programa, como a redução das renúncias tributárias, que já foi proposta, inclusive, na PEC emergencial. Para o diretor executivo da IFI, Felipe Salto, preocupa a adoção de uma política que reduz o seguro-desemprego no momento em que o mercado de trabalho "ainda está cambaleante". "Precisamos passar a ter no Brasil a prática de avaliar políticas públicas para não incorrer em eventual erro de propor aquilo que não funciona." 

Resposta
Procurado, o Ministério da Economia afirmou em nota que a decisão de editar a MP do Verde Amarelo "se baseou na percepção de que os ganhos para a população-alvo compensam qualquer perda eventual com o efeito substituição". Segundo o ministério, com a adoção da política, cerca de 1,8 milhão de jovens vulneráveis serão contratados com salários de até 1,5 salário mínimo, sendo "empregados de forma mais rápida do que se contassem apenas com a recuperação da economia".

O secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, cuja secretaria concebeu a medida, disse que o projeto foi bastante discutido internamente, tendo sido "avalizado tanto do ponto de vista técnico quanto do ponto de vista jurídico". Segundo Marinho, o governo entende que o Congresso é agora o foro ideal para que o texto seja discutido e, eventualmente, corrigido em alguns pontos. "Não há programa social mais importante do que o emprego", disse Marinho a jornalistas.

No anúncio oficial do programa, o governo anunciou a concomitante criação de uma contribuição previdenciária de 7,5% sobre o seguro-desemprego para bancar a desoneração da folha de pagamento no programa Verde Amarelo.

O custo da desoneração para os cofres públicos será de cerca de 10,6 bilhões de reais em cinco anos, conforme exposição de motivos da MP. Mais alto que o previsto pela SPE, o valor embute maior criação de vagas do que a projetada pela secretaria. Já as receitas com a contribuição sobre o seguro-desemprego serão um pouco superiores nesse mesmo período, ficando em torno de R$ 11,5 bilhões, segundo apontou à época o secretário Marinho.

Pelas regras instituídas pelo governo, a modalidade só vale para remuneração até 1,5 salário mínimo, sendo que a empresas poderão contratar pelo programa até 31 de dezembro de 2022, com contratos que poderão durar até dois anos.

Ao contrário do programa, que tem data pra acabar, a contribuição sobre o seguro-desemprego será permanente no desenho criado pelo governo.

Fonte: Reuters e Agência Estado

Share this post!

Bookmark and Share

0 comentários:

Postar um comentário