Fonte: O Estado de S.Paulo
No pacato interior sergipano, a monotonia é quebrada pelo vaivém intenso de ônibus transportando centenas de estudantes a Aracaju. Obrigados a encarar quatro horas de viagem para ir e voltar pela perigosa BR-101, alguns dos 700 jovens enviados todos os dias à capital sonham com boas perspectivas de carreira na Vale e, sobretudo, em trabalhar perto de casa.
Mesmo com manifestações e faixas contra o atual projeto da Vale no município vizinho, a chegada da mineradora na região é aguardada com ansiedade. "Tanto faz se ficar lá ou aqui. O importante é a gente ter emprego", diz a técnica em informática Iza Luanne Moura, 23 anos, moradora de Japaratuba.
Mãe de uma menina de três anos, tem como meta uma vaga na empresa. "Já tentei entrar duas vezes, mas não consegui. Queria muito", lamenta. "Sei que eles dão plano de saúde, alimentação e até farda. Tenho dois amigos lá", diz, referindo-se à usina da Vale em Rosário, a 50 km dali.
Desempregado, o ajudante de pedreiro Carlos César dos Santos, 24 anos, segundo grau completo, alimenta projeto semelhante. Morador de Capela, faz curso de eletricista de olho em uma futura vaga na mineradora. "Se estivessem pegando gente, eu seria o primeiro da fila", diz, ao lado de sete colegas. O professor do Senai Otacílio Almeida Neto, há 12 anos no ramo, se anima. "É a nona turma e eles só falam em
trabalhar no projeto." Neto começou a estruturar um curso de soldador em parceria com a prefeitura. Em dois anos, 1,8 mil alunos já foram treinados em diversas áreas, de técnicos em informática a mecânicos e cozinheiros.
Pressa. Estagiária na prefeitura de Japaratuba, Karine Sá, 23 anos, viveu, por cinco anos, a rotina de horas num ônibus até se formar engenheira civil. Agora, planeja ficar na cidade para tentar vaga na área de segurança do trabalho. "Quero trabalhar logo. Tomara que parem de conversa e resolvam logo." A amiga Ingrid Andrade, 21 anos, pensa o mesmo. "Ninguém aguenta mais falar em carnalita."
Mesmo ansiosos, os jovens terão de esperar. O silêncio da Vale sobre os rumos do projeto alimenta uma desconfiança geral sobre eventual desistência da empresa. "Se ela quisesse mesmo, já teria vindo", avalia o presidente da Federação das Indústrias de Sergipe (Fies), Eduardo Prado de Oliveira.
Um manifesto público do Fórum Empresarial de Sergipe, que reúne 30 associações patronais, defendeu o projeto e criticou o embate político.
"O desenvolvimento de Sergipe não pode ser subjugado a interesses políticos menores e imediatistas." A desistência teria impacto nos planos estratégicos de montar um polo de fertilizantes, reduzindo as importações de potássio. Em suas projeções, a Vale estima "poupar" US$ 17 bilhões em divisas ao País até 2034. Hoje, 90% do potássio é importado, principalmente da Rússia e Canadá. Sergipe já tem ureia produzida pela Petrobrás em Laranjeiras e um pólo de misturadoras de insumos (potássio, fósforo e nitrogênio) vendem o adubo diretamente ao produtor. A demanda está garantida pelos canaviais locais e de Pernambuco, além da soja e do
milho da Bahia. / M.Z.
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