Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias é a entidade com maior adesão, com cerca de 13 mil associados Foto: Uliane da Rosa / Sindicato dos Metalúrgicos
Desde as movimentações geradas no período que antecedeu a aprovação da Reforma Trabalhista, em 2017, entidades sindicais de todo o país vivenciaram um enfraquecimento, tanto no âmbito constitucional quanto no poder de atuação diante da redução de arrecadação, com o fim da obrigatoriedade do chamado imposto sindical. A perda de representatividade foi provocada não só em nível parlamentar e governamental, após o impeachment de Dilma Rousseff (PT), mas também na própria opinião pública, quando muitos trabalhadores admitiram as mudanças na legislação trabalhista.
Quase três anos após a aprovação da reforma, chamada por muitos delegados sindicais como “desmonte dos direitos trabalhistas”, as entidades, tanto as que representam trabalhadores quanto as patronais, testemunham no âmbito da pandemia do coronavírus o início do movimento de resgate da valorização da atuação de sindicatos. O motivo é o aumento da demanda pela intervenção sindical para formalização e negociação de acordos emergenciais durante a crise sanitária.
— Os trabalhadores são os mais expostos aos riscos econômicos e sociais que virão (após controle da pandemia). Também estão mais expostos ao contágio, uma vez que são eles que utilizam transporte público, além de executarem as atividades laborais em locais com grande concentração populacional. Por isso, desde o início da pandemia, sindicatos de diferentes categorias em todo o Brasil têm buscado garantir os direitos dos trabalhadores. Foram inúmeros acordos firmados nos últimos dois meses, em todos os setores, visando preservar a saúde dos trabalhadores e garantir o emprego — pontua o supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese-RS), Ricardo Franzoi.
Não há estimativa da totalidade de acordos de redução de jornada ou suspensão de contratos de trabalho firmados em Caxias do Sul e região desde a aprovação da Medida Provisória 936, que propõe medidas para evitar (ou protelar) demissões de trabalhadores. Entretanto, o gerente da Secretaria Regional do Trabalho do Ministério da Economia, Vanius Corte, destaca que o papel dos sindicatos têm sido primordial na proteção dos trabalhadores.
— Existe ainda a crítica de que sindicato não serve para nada, que não faz nada, o trabalhador não quer pagar (a contribuição sindical), pois acha que não tem importância. Mas a gente vê que, neste momento, os sindicatos têm sido fundamentais, inclusive propondo soluções melhores do que as apresentadas pelo governo. Não só sindicato de trabalhadores, mas os patronais também. Acho que por parte dos trabalhadores ainda está na fase de questionar o papel do sindicato. Talvez agora comecem a notar que a atividade sindical é importante — ressalta Vanius.
Há 33 sindicatos de trabalhadores e 21 patronais com base em Caxias. Muitos deles com atuação em âmbito regional.
Resgatar a união
Representando a maior categoria da Serra, o Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul e Região sentiu o abalo da perda de reconhecimento nos últimos 10 anos, quando passou de cerca de 18 mil associados para aproximadamente 13 mil atualmente. Muito se deve ao encolhimento do mercado de trabalho, mas boa parte, segundo o presidente da entidade, Assis Melo, decorre das próprias políticas que enfraqueceram a reputação e desvalorizaram a atuação sindical.
— O sindicato sempre teve importância, só não foi reconhecida em alguns momentos. Mas durante essa crise o trabalhador olhou para o lado para ver quem ficou para defender ele e percebeu que só restou o sindicato. É um momento difícil ainda, mas é o momento de as entidades prestarem assistência e atualizar as suas reivindicações — destaca Assis.
A qualidade depende da participação dos trabalhadores
Por definição, sindicatos se dedicam a lutar por interesses sociais, econômicos e profissionais de um grupo vinculado a uma atividade laboral, ou atividade similar. Portanto, organizado pela própria categoria. A história mesmo atesta que o surgimento do movimento deu-se pela união de operários durante a Revolução Industrial, há mais de 200 anos, na Europa. Era comum no século 19 que trabalhadores cumprissem jornadas diárias de 14 a 17 horas. A resistência a essa condição foi um dos estopins para a insurgência de movimentos trabalhistas.
No Brasil, os primeiros grupos instituídos só começaram a surgir no Século 20, embora já constem registros de lutas por direitos trabalhistas logo após o fim da escravatura no país.
As organizações sindicais, entretanto, viriam a se afirmar como força durante a Era Vargas e mais enfaticamente com a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), em 1943. Embora com relativa demora (em comparação aos demais países), todos os direitos adquiridos por trabalhadores originaram-se da mobilização desses grupos.
O desmerecimento ou falta de vinculação das conquistas às reivindicações sindicais, no entanto, estabeleceu-se culturalmente no país, muito em razão da pouca atuação de algumas entidades, que contribuíram para a crescente desvalorização, na visão do trabalhador.
— Se o Ministério do Trabalho quisesse ele poderia ver quais entidades são realmente comprometidas com o trabalhador. É simples, é só pegar no sistema mediador e ver quais entidades que fazem acordo, quais têm convenções coletivas. Não vou dizer que não existem sindicatos de gavetas, porque a gente sabe que existem. Mas não podemos generalizar, colocar todos na mesma bacia e jogar a água fora — sugere Jair Ubirajara da Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Hoteleiro, Restaurantes, Bares e Similares e em Turismo e Hospitalidade de Caxias do Sul (Sintrahtur).
A revalorização
Presidentes de entidades representativas de Caxias do Sul foram ouvidas pelo Pioneiro. Todos reconheceram a maior procura durante a crise do coronavírus e ressaltaram indícios de revalorização da atuação sindical por parte de trabalhadores e empresas. Confira:
“Sindicato sempre desempenhou trabalho fundamental, não só na atuação sindical, mas também assistencial. Com tudo que aconteceu desde a lei 13.467, que veio tirar poderes do sindicato, num primeiro momento houve debandada (de associados). Agora na pandemia, muitos que tinham por base se manifestar contra retornam e percebem a importância do papel sindical. É uma das únicas instituições em que eles podem confiar.” Jair Ubirajara da Silva, presidente do Sindicato dos Trabalhadores no Comércio Hoteleiro, Restaurantes, Bares e Similares e em Turismo e Hospitalidade de Caxias do Sul (Sintrahtur)
“Antes, o papel do sindicato patronal era o acordo coletivo, agora o papel do sindicato está sendo muito forte. Além dos acordos extraordinários, estamos buscando ser protagonistas. (As empresas) estão começando a enxergar o valor do sindicato. E se antes estávamos mais focados nas questões trabalhistas, agora, neste momento, reconhecemos como podemos ser ativos e criamos três frentes, a da saúde, a social, e a trabalhista, para preservar os empregos, trabalhando em conjunto com o sindicato dos trabalhadores.” Paulo Spanholi, presidente do Sindicato das Indústrias Metalúrgicas, Mecânicas e de Material Elétrico de Caxias do Sul (Simecs)
“Com a pandemia, o empresário se viu necessitado do sindicato. As próprias medidas que o governo propôs nós já tínhamos firmado com o sindicato trabalhista anteriormente. Estamos sendo bem vistos pela sociedade. É normal (que as pessoas reconheçam os sindicatos somente quando precisam). Muitos, no entanto, não sabem que não somos só uma organização em função de leis e normas trabalhistas, mas temos convênios ao nosso associado. Começamos a ter diálogo mais aberto, fazendo ações em conjunto, e isso deixa mais leve as negociações.” Idalice Manchini, presidente do Sindicato do Comércio Varejista (Sindilojas)
“Estamos enxergando a volta da valorização dos sindicatos, que o trabalhador tinha esquecido graças a toda mídia contrária que tinha sido feita com a reforma trabalhista. Mas com esse momento de crise, os sindicatos tiveram papel muito importante nos acordos coletivos, redução de jornada e suspensão de contrato. Todos os acordamos que fizemos foram para garantir a estabilidade do emprego, então o trabalhador começou a nos ver com outros olhos. Nesse momento de pandemia atingiu muito o trabalhador e a maioria dos que precisaram do sindicato mudaram a visão.” Nilvo Riboldi, presidente do Sindicato dos Empregados no Comércio de Caxias do Sul (Sindicomerciários)
“Quando o trabalhador começa a ver a necessidade de ter alguém para ajudar ele, olha para o lado e só vê o sindicato. É um momento difícil ainda para os sindicatos, mas é o momento de as entidades prestar a assistência e atualizar as suas reivindicações. Mas é preciso resgatar que o trabalhador perceba que é preciso se unir, porque o próprio sindicato surgiu da necessidade de o trabalhador se defender coletivamente.” Assis Melo, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias e Região
Fonte: Pioneiro
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